Ministério da Saúde anuncia criação de debêntures incentivadas com foco na infraestrutura do SUS

Empresas privadas poderão captar investimentos com emissão de debêntures com foco em projetos de em estabelecimentos de saúde pública.

 

O Ministério da Saúde anunciou, na última sexta-feira (25), a criação de debêntures incentivadas da saúde. A ideia é que empresas possam emitir títulos de dívidas para investir em estabelecimentos vinculados ao Sistema Único de Saúde (SUS). A minuta de portaria que regulamenta o tema está em consulta pública até 10 de agosto.

“É para construção de plantas, prédios, compra e modernização de equipamentos, e ampliação de instalações também. Esse era mais um dos anúncios que tínhamos para fazer, no sentido de construir um arcabouço completo de políticas de apoio ao desenvolvimento produtivo, à inovação e ao acesso à saúde no Brasil”, disse Fernanda de Negri, secretária de Ciência, Tecnologia e Inovação e do Complexo Econômico-Industrial da Saúde (Sectics) do Ministério da Saúde, durante o Saúde Estratégica Brasil – Américas, evento organizado pela Organização Pan-Americana da Saúde (Opas), na Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp).

Em linhas gerais, a empresa ou instituição interessada deve estruturar todo o projeto, definindo valor, prazo, remuneração e garantias. Depois, conforme a portaria, o emissor submete para aprovação do Ministério da Saúde. Se aprovado, a empresa registra a debênture na CVM e a disponibiliza para investidores normalmente por uma corretora ou um banco.

Para fontes do mercado, o mecanismo deve funcionar de forma semelhante às debêntures incentivadas de infraestrutura, que possibilitam que empresas captem recursos no mercado para financiar projetos. Petrobrás, Vale e CCR emitiram títulos do tipo, com valores que chegam a R$10,75 bi, investidos em obras como modernização e melhorias como a da Rodovia Presidente Dutra.

Na saúde, os analistas apontam que, para os investidores, mais importante do que quais projetos serão investidos no SUS, são as empresas que irão emitir os títulos. Caso grandes companhias, com credibilidade e baixo índice de endividamento participem, as debêntures incentivadas da saúde podem ter uma boa adesão. Isso porque não há garantias do Banco Central para esse tipo de emissão.

Sendo um título com isenção de Imposto de Renda (IR), atrai investidores individuais que buscam uma rentabilidade maior que outras categorias, com um risco calculado com base na saúde financeira das empresas. Há possibilidades de mudanças nas regras, com perspectivas de 5% de IR a partir de 2026, que pode desestimular investimentos do tipo. O tema está em discussão no âmbito do aumento do IOF, que envolve Congresso Nacional, Governo Federal e Supremo Tribunal Federal (STF).

“Para isso ganhar corpo, vai depender muito de qual empresa que vai emitir esses títulos, porque não tem garantia do governo, só tem um subsídio nas taxas. O que vai acontecer é que vai olhar se o emissor é seguro ou não, se a empresa que está realizando aquele projeto é segura ou não”, afirma Marilia Fontes, sócia-fundadora da Nord Investimentos.

Por que é importante para o SUS?

“Várias iniciativas de investimento em parceria público-privada podem agora se beneficiar da captação de funding para esse financiamento por meio de debêntures incentivadas. Estamos regulamentando isso por meio de uma portaria do Ministério da Saúde, a partir da qual as empresas e os executores desses projetos vão poder lançar essas debêntures no mercado”, disse Fernanda de Negri, em evento na última sexta-feira (25).

Reformas, manutenções e construções de unidades de saúde estão entre os projetos que poderão receber investimentos no âmbito de parcerias público-privadas. Eles serão avaliados e aprovados pelo Ministério da Saúde, que irá autorizar a emissão de debêntures incentivadas no valor de 50%, 90% ou 100% do financiamento.

“O governo está dando benefício para alguns setores para efetivamente captar. Há uma expectativa de corte de despesas. Então, faz sentido o governo captar isso via mercado financeiro, dado que ele não vai ter mais funding para financiar essa expansão da infraestrutura”, explica Haroldo Monteiro, sócio da TCP Partners e professor do MBA Finanças do Ibmec.

Em relação ao retorno ao investidor, no caso de uma das debêntures incentivadas da Petrobrás, a remuneração era de IPCA +6,3874% ao ano, com vencimento em 2035. O valor de R$ 1,2 bilhão arrecadado pela petroleira seria destinado a ampliar a capacidade de escoamento e processamento de gás natural proveniente do Polo Pré-Sal da Bacia de Santos.

Marilia Fontes observa que, no caso da saúde, deve haver um conjunto de projetos dentro de um mesmo financiamento, para atingir um valor comparável aos que estão sendo captados em projetos de infraestrutura. Uma reforma de uma Unidade Básica de Saúde (UBS), por exemplo, tem um valor muito baixo quando comparado à construção de um hospital. “Isso poderia ser um valor maior, que realmente aumentasse bastante o investimento no setor. Debêntures de infraestrutura ficaram muito populares porque eram títulos isentos vendidos para o investidor pessoa física. O sucesso vai depender do emissor, porque o varejo não tem condição de analisar um projeto de reforma do SUS”, observa a sócia da Nord Investimentos.

Qual a viabilidade e quem deve participar?

Dados da Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (Anbima) apontam para a emissão de R$ 62,5 bilhões nos primeiros cinco meses de 2025, com um aumento de 39,3% na comparação com o mesmo período no ano anterior. De acordo com Monteiro, isso mostra como alguns setores estão captando mais recursos para investimentos.

“Com a abertura dessa possibilidade de debêntures incentivadas para o setor de saúde, há um leque maior de opções para o mercado privado. Existe muita liquidez no mercado, que está procurando bons papéis, não encontra ou está alocado muito pesado em determinado setor. A abertura desse leque dá ao mercado financeiro a possibilidade de diversificar mais a sua carteira de investimentos. É uma possibilidade bem interessante”, afirma o sócio da TCP Partners.

Contudo, não há uma visão tão clara sobre quem deve participar. Como são obras de infraestrutura, de manutenção, reforma, ampliação e modernização de estabelecimentos de saúde, os analistas apontam que tanto empresas de saúde de capital aberto, como Rede D’Or e Oncoclínicas, como empresas de construção podem propor projetos. É preciso aguardar os próximos passos.

“Essas debêntures têm volumes mais significativos. Existem muitas empresas que não são de capital aberto com condições de fazer essa emissão de debêntures. Existe um processo para ela ser incentivada, tem que cumprir alguns parâmetros com relação à regulação”, afirma Haroldo.

Mais do que segmento, os analistas apontam que o que importa para o investidor são as empresas que vão emitir os títulos. “Vejo mais o caso de concessionárias ou de construtoras, que tem mais essa relação mais umbilical com o governo, atuarem na saúde. No caso de debêntures de infraestrutura, várias coisas entraram nessa seara, por exemplo, tem uma grande transmissora de energia elétrica que quer fazer um novo parque de transmissão, ou petroleiras. Muitas empresas tradicionais entram nesse setor”, explica Fontes, da Nord Investimentos.

 

Fonte: Futuro da SAÚDE