Estima-se que 1 em cada 10 pacientes sofra algum dano ao receber cuidados hospitalares. O que representa, a cada ano, 134 milhões de eventos adversos em hospitais de países de baixa e média renda devido a cuidados em saúde inseguros, resultando em 2,6 milhões de mortes, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS).
“Com o predomínio persistente de elevado número de incidentes no cuidado de saúde com danos para os pacientes, os profissionais de saúde relutam em falar abertamente sobre o assunto e compartilhar informações relevantes com os pacientes. Portanto, é de extrema relevância e urgência tratar do disclosure”, explica Aline Albuquerque, professora, pesquisadora e coordenadora do grupo temático de trabalho Jurídico da Sociedade Brasileira para a Qualidade do Cuidado e Segurança do Paciente – SOBRASP – que traz o tema à tona em seu congresso anual, em setembro.
Segundo Aline, embora seja intuitivamente perceptível que os pacientes tenham esse direito, pesquisas apontam que apenas 30% dos eventos adversos são revelados pelos profissionais de saúde a quem mais importa.
“Profissionais da saúde têm o dever de informar aos pacientes e familiares – de forma transparente e empática – quaisquer danos assistenciais que possam acontecer, ainda que muitas vezes o conhecimento sobre o ocorrido possa ser traumático”, diz a coordenadora. Por isso mesmo, “o momento do disclosure requer cautela e preparo emocional, para que o diálogo seja honesto, empático e oportuno; também requer atenção para que a situação não se agrave e não haja uma ruptura drástica na relação de confiança construída entre os profissionais de saúde, pacientes e a instituição”.
Aline destaca que o disclosure é um elemento-chave da resposta precoce e da investigação de incidentes de segurança do paciente. “Eventos adversos acontecem durante um procedimento ou um tratamento e não devem ser omitidos”, completa. O disclosure está associado à garantia do direito à informação, do direito de acesso ao prontuário, do direito à reparação integral e do direito à confidencialidade das informações pessoais A prática é própria de uma cultura que promove a qualidade e a segurança do paciente.
A baixa Literacia para a Saúde também é entrave
A Literacia para a Saúde (LS) é outro tema que será discutido no congresso da SOBRASP em setembro. Em linhas gerais, a LS envolve a motivação e as competências pessoais que permitem ao indivíduo acessar, compreender, avaliar e decidir sobre as questões de saúde em seu cotidiano.
“Sendo assim, conclui-se que o paciente com baixa LS perde muito em qualidade de assistência. Ou seja, além de não saber como agir adequadamente diante das necessidades de sua própria saúde, muitas das vezes nem sabe como mover-se nas diversas instâncias dos serviços de saúde”, diz Claudia Corrêa, coordenadora do grupo temático de trabalho em Odontologia da SOBRASP e cirurgiã-dentista.
É muito importante que os profissionais da saúde trabalhem para o aumento da LS de seu paciente. Para isso, entre outras coisas, é imprescindível uma comunicação efetiva que atente para o uso de jargões ou linguagens próprias da saúde com os pacientes e seus familiares. “Não importa o nível de escolaridade ou instrução, em determinado momento a pessoa pode ser exposta a informações difíceis de serem assimiladas rapidamente, ou porque foram ouvidas pela primeira vez ou porque são muito complexas. É preciso que sejam passadas com muita paciência e numa linguagem clara e acessível ao ouvinte, além de termos a certeza de que houve a compreensão correta”, destaca Cláudia.
Segundo ela, não é porque o paciente acena que “sim”, com a cabeça, que ele realmente compreendeu todas as informações. “Ele pode dizer ‘sim’ por vergonha, por pressa ou para não ‘incomodar’ o profissional de saúde”, explica.
A especialista detalha, ainda, que a baixa LS pode afetar diretamente a saúde das pessoas. “Se o paciente não sabe onde procurar informações confiáveis, não se interessa por compreender o curso da doença que lhe acomete ou por entender o tratamento, não saberá quando deve buscar atendimento no caso de uma intercorrência no uso de um medicamento, por exemplo. Assim, ele não estará adequadamente inserido no cuidado em saúde e não se apropria de todos os recursos com os quais poderia contar a fim de contribuir consigo mesmo, ou com algum de seus entes queridos, no percurso da assistência”, completa Cláudia.